"Bater ou não bater?
A discussão é quem, como e onde vai bater primeiro na intrusa Marina, que chegou atrasada, por uma fatalidade, e já bagunçando o coreto. Dilmistas e aecistas estão loucos para bater, mas morrem de medo (...)
Dilma vai desviar as baterias de Aécio para Marina, hoje a ameaça principal. Com a economia crescendo 7,5%, Serra tinha em torno de 30% em agosto de 2010. Com crescimento menor que 1%, Aécio só chega a 20% no mesmo mês da campanha. Ou seja: ele se enclausurou nos votos tucanos. É bobagem Dilma bater aí, porque são votos que não vão para ela e para o PT de jeito nenhum.
Aécio vai ter de bater no mau governo de Dilma e nos desmandos do PT, mas sem deixar Marina correndo solta rumo ao segundo turno. E Marina pode bater em quem quiser, mas o problema dela não é só mostrar o que há de ruim nos outros, mas o que há de bom nela além dos sonhos."
Os críticos das eleições em dois turnos resumem suas críticas quase sempre em algo como 'a escolha do menos detestado'. O exemplo das eleições atuais servem para ilustrar a crítica:
Aécio, segundo colocado, tem sua vaga no segundo turno ameaçada por Marina, terceira colocada. Para ir ao segundo turno, tem duas opções: tirar o lugar de Dilma, a primeira colocada, e algo que tem pouca chance de fazer, ou garantir que Marina não tome seu lugar, o que é mais lógico. Só que se ele focar suas forças contra Marina para garantir sua vaga no segundo turno, alienará os eleitores e apoio desta no segundo turno, o que entregará a eleição de bandeja para Dilma. Venceria a batalha mas perderia a guerra.
Dilma, por sua vez, deveria focar sua batalha contra Marina. Isso porque tudo indica que Aécio não representa real ameaça para ela no segundo turno, mas Marina representa. O problema é que ao escolher Marina como alvo para evitar que ela chegue ao segundo turno, Dilma cria uma situação na qual sai perdendo de qualquer maneira: se Aécio chega ao segundo turno, Marina e seus eleitores, alvo das críticas de Dilma no primeiro turno, tenderão a apoiar Aécio, dando a ele a única chance de vencer o segundo turno. Se, ao contrário, Marina chegar ao segundo turno, os eleitores de Aécio tenderão a apoiar Marina, aumentando ainda mais as chances desta contra Dilma.
Em qualquer dos cenários, o que fica claro é que o segundo turno cria uma dinâmica diferente, na qual o candidato tem que apresentar suas idéias e se opor aos adversários pensando não em uma única interação, mas em uma segunda interação dependente da primeira.
Segundo a teoria dos jogos, que é a disciplina da matemática que explica essas relações de ajuda e destruição mútua, essa multiplicidade de interações força os adversários a terem de agir de forma mais cautelosa (alguns diriam mais ética) não porque querem, mas porque se agirem conforme seus impulsos, acabam saindo perdendo mais adiante.
Críticos, contudo, dizem que eles não agem necessariamente de maneira mais ética, mas mais hipócrita. Se fossem de fato honestos, agiriam de forma a destruir seus próprios interesses de longo prazo.
No exemplo acima, sem o segundo turno, cada uns dos três partiria para a guerra aberta contra os outros dois, já que, sem um segundo turno, não precisariam levar em conta o eventual apoio do perdedor do primeiro turno.
Mas então qual é a vantagem de termos um segundo turno?
Ele ajuda a destilar o voto. No segundo turno não escolhemos quem é o candidato preferido dentre todos, mas quem é o candidato preferido dentre os dois preferidos no primeiro turno. Isso têm dois elementos de legitimidade:
Primeiro, dá maior legitimidade matemática ao vencedor, que será eleito necessariamente com mais da metade dos votos válidos. Em uma eleição com único turno, bastaria ele ter mais votos que qualquer outro candidato, ainda que sua votação fosse insignificante no cômputo geral. Em uma país prolífico em partidos e candidatos como o Brasil, poderíamos ter um candidato eleito, por exemplo, com meros 10% dos votos se os outros candidatos obtivessem percentuais de um dígito.
Segundo, dá ao eleitor a possibilidade cujo candidato saiu derrotado do primeiro turno de decidir entre dois candidatos nos quais não votou no primeiro turno. A legitimidade programática. Para quem é a favor do sistema de dois turnos, isso significa que este eleitor tem sua voz ouvida e isso aumenta ainda mais a legitimidade da eleição. Para quem é contra, esse mesmo eleitor não está escolhendo quem prefere, mas quem detesta menos. Dos males, o menos pior.